quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

"ISSO É ESPARTA!"

Exército espartano. Note: símbolo
GLS em seus escudos.
Para quem já assistiu ao filme “300” que conta a história do jovem rei Leônidas I e o exército dos trezentos na Batalha das Termópilas, e em geral aos filmes que narram batalhas épicas do mundo antigo grego e romano, não imagina que comportamentos homossexuais e bissexuais eram frequentes e estimulados no meio dos exércitos, na vida social e na cultura homossocial.

A forma mais difundida e socialmente significativa de relação sexual íntima entre pessoas do mesmo sexo na Grécia dos períodos arcaico e clássico era entre adultos e adolescentes, conhecida como pederastia. A pederastia era associada com a entrada na vida militar e na religião de Zeus. Além disso, tinha também um caráter pedagógico e a finalidade de transmissão de conhecimento de homens mais experientes aos jovens.

Parceiros pederastas.
Os antigos gregos não concebiam a ideia de orientação sexual como um identificador social, da maneira que as sociedades ocidentais vêm fazendo ao longo do último século. A sociedade grega não distinguia entre desejo e comportamento sexual com base no gênero de seus participantes, mas sim pela extensão com que tais desejos ou comportamentos se conformavam às normas sociais, que eram baseadas por sua vez no gênero, idade e status social.

De acordo com este ponto de vista, qualquer atividade sexual onde um homem penetrasse um inferior social seu era tida como normal, como "inferiores sociais" poderiam estar incluídos mulheres, jovens rapazes, estrangeiros, prostitutas ou escravos, e ser penetrado, especialmente por um inferior social, era considerado potencialmente vergonhoso.

Imperador romano Adriano e seu jovem amante Antinous.
Na realidade romana antiga o comportamento homossexual era considerado um costume cultural em certas províncias. A bissexualidade era norma, porém os autores antigos reconhecem que na Roma Antiga havia homens que mantinham relações sexuais exclusivamente com homens.

“... a compreensão universalizante da sexualidade baseada na mobilidade multiforme do desejo sexual e na bissexualidade como potencial em qualquer pessoa”. Sigmund Freud

No período mais expressivo do Império Romano a pederastia tinha perdido as restrições que possuía em seu status como forma de educação ritual havia muito tempo e, em seu lugar, se converteu em uma forma de satisfação do desejo sexual. Contudo, a aceitação social das relações pederastas e homoeróticas foi diminuindo ao longo dos séculos à medida que se foi implantando o cristianismo.

Lebrys, um símbolo lésbico e uma arma
usada pelas Amazonas.
Não há muitos registros iconográficos na história antiga da homossexualidade feminina, porém há referências poéticas e mitológicas como o caso dos poemas de Safo, uma poetisa grega que vivia na ilha de Lesbos, e das Amazonas que tinham um sistema de duas rainhas e uma sociedade altamente feminista.

Em Esparta o estreitamento dos laços entre dois guerreiros poderia fazer com que estes ficassem mais dispostos a lutar pela cidade-estado. Além disso, o próprio envolvimento servia de estratégia ao impelir o soldado a continuar em batalha pelo seu companheiro.

Um dos mais contundentes exemplos desse traço da cultura espartana pode ser visto na figura do general Pausanias. Na qualidade de sucessor do rei Leônidas, este conhecido líder militar defendeu a prática homossexual como sendo uma forma de expressão amorosa superior. Contudo, fazia questão de criticar severamente esse mesmo costume entre homens que fossem de uma mesma faixa etária.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

BREVE HISTÓRIA E CONTEXTUALIZAÇÃO DO EUNUCO

Shabnam Mausi um hijra
como os eunucos são
chamados na Índia.
Por volta de 1050 a.C. na China surgem, quando a castração foi incluída nos códigos legais chineses como forma de punição, os eunucos. Eunuco é um homem cujo pênis e os testículos (ou apenas os testículos) foram removidos, ou são congenitamente não funcionais e ainda por castração voluntária. Em sua origem grega, o termo eunoukhos pode ser traduzido como "guardião da cama". No Oriente Médio e na China, eunucos foram usados como guardas ou serviçais dos haréns onde ficavam as esposas e concubinas reais. Na Grécia antiga, a prática era usada como pena para impedir a reincidência em casos de estupro ou adultério, embora os gregos também costumassem castrar serviçais domésticos para torná-los mais dóceis e inofensivos.

A bíblia também relata vários casos de eunucos principalmente no livro de Ester, pois o cenário principal se passa nos haréns dos palácios pérsicos. Talvez o caso mais famoso seja o eunuco etíope, o qual seria um importante funcionário de Candace, rainha da Etiópia, que é batizado por Filipe, o Evangelista (Atos 8:26-40). O próprio Jesus declara e inclui o dom do celibato como uma forma de ser eunuco.
Ilustração de Felipe, o Evangelista explicando uma
passagem da bíblia ao eunuco etíope.

"Porque há eunucos que nasceram assim; e há eunucos que pelos homens foram feitos tais; e outros há que a si mesmos se fizeram eunucos por causa do reino dos céus. Quem pode aceitar isso, aceite-o." (Matheus.19:12)

Por vezes os eunucos podem apresentar uma orientação sexual assexuada, que é caracterizada pela indiferença à prática sexual, ou homossexuada. Eunuco também pode ser sinônimo de transexualidade, porém não é um fator determinante da orientação sexual nem da identidade de gênero. Mas uma coisa é certa: a principal finalidade da castração era tornar os eunucos sexualmente impotentes.

Historicamente a condição de ser eunuco apresenta raízes socioeconômicas. A castração voluntária era uma forma de escapar da miséria e os filhos de camponeses davam-se ao sacrifício em nome da família. Muitos deles enriqueciam e ocupavam cargos influentes ou simplesmente influenciavam seus senhores em uma espécie de oráculo pajem.

Eunucos os senhores dos haréns.
No contexto judaico-cristão a famigeração dos eunucos, que é uma importação dos costumes sacerdotais pagãos de outras culturas contemporâneos ao povo judeu, parte do principio da incapacidade de reprodução. A lei excluía esses indivíduos da sociedade, mesmo com a adaptação proposta no livro de Isaías:

“Pois assim diz o Senhor: "Aos eunucos que guardarem os meus sábados, que escolherem o que me agrada e se apegarem à minha aliança, a eles darei, dentro de meu templo e dos seus muros, um memorial e um nome melhor do que filhos e filhas, um nome eterno, que não será eliminado.” (Isaías 56.4-5)

Nitidamente a graça está por trás desta “adaptação” à realidade. A Lei aponta para um mundo ideal, onde não haja homens incapazes de reproduzir. Porém, a graça lida com as demandas da realidade. A Lei acentua a distância entre o real e o ideal. A graça reverte este fluxo. Em vez de exclusão, inclusão. Em vez de distanciamento, aproximação.

O eunuco da vez é todo aquele que desprezamos, do qual queremos distância. Pelo menos assim, não seremos obrigados a amá-los, já que esta obrigação só diz respeito ao próximo.